Caminhava, no último sábado, por um shopping daqui de Salvador, entre cumprimentos carinhosos e diria até afagos, um jovem me parou, meio que abruptamente, e disse, em tom hostil: – Medrado, gosto de você, mas a sua religião é racista. Allan Kardec foi racista, ele disse que a raça negra, por suas características físicas, era inferior. Ato contínuo, concordei com ele, simplesmente dizendo: – Você tem razão, concordo com você. O jovem se chocou, talvez esperasse alguma controversa, mas a minha assertiva o pegou de surpresa. Sorrindo meio embaraçado, ele se despediu e seguiu o seu caminho.
O mais curioso do acontecido, no entanto, para mim, veio depois, pois uma senhora que a certa distância acompanhava a abordagem se aproximou e em tom professoral, admoestou-me: – Desculpe, José Medrado, mas você não deveria concordar com aquele rapaz, pois dentro de um contexto social – e a partir daí ela quis me dar uma aula de história, reportando que naquela época (final do século XIX ) a Europa toda era racista... e por aí foi. Fiz cara de paisagem.
Na semana em que se pontua o Dia da Consciência Negra vemos, infelizmente, que ainda nos falta a coragem para a afirmação de que o nosso país é racista. Não aconteceu ainda uma espécie de mea culpa de consciência efetiva, sem as justificativas, que buscam atenuar o que de fato ocorreu e ocorre nestas terras, em decorrência do preconceito de raça. Precisamos, como nação, afirmar, sim, que somos, para a partir daí expurgarmos toda e qualquer forma de estímulo consciente, inconsciente ou de omissão de tais posicionamentos. O assumir tal realidade só enaltece o compromisso de sermos melhores como povo. Não podemos mais escamotear a realidade com desculpas.
Ora, o Brasil já teve a ideologia do branqueamento, apoiada pelo governo, o qual facilitava a entrada de imigrantes europeus e árabes em terras brasileiras, e por correntes científicas, como a corrente do darwinismo racial e do higienismo. Ocorreu até na religião e na minha inclusive, quando no começo do século XX, e até hoje em muitos centros, se proibia a comunicação de espíritos nativos do Brasil, pretos-velhos, índios...
Nessa esteira de tristeza e perseguição, muitos negros preferiram se casar com companheiros(as) de pele mais clara, a fim de que seus filhos tivessem menor probabilidade de sofrer com o racismo. Não é muito diferente quando vemos jogadores de futebol negros com esposas loiras: a necessidade de pertencimento, em uma sociedade de essência racista. Assim, que nesta semana possamos, sim, rever posturas, concluir por atitudes que possam, verdadeiramente, dar um basta a este absurdo de discriminar por diferenças, sejam quais forem. Sejamos todos Zumbi dos Palmares.
José Medrado
Mestre em família pela Ucsal e fundador da Cidade da Luz