Tenho recebido muitos pedidos no meu programa da rádio Metrópole e pelas redes sociais para que opine sobre a novela Babilônia, e geralmente os comentários trazem como esteio a premissa de que esta novela "veio para destruir os valores da família brasileira". Ora, alguém já disse e com propriedade que a arte não pode estar a serviço de crenças e valores que grupos elejam como certos, mas aberta à sociedade para que possa, com liberdade, provocar discussões de comportamento, pautando o que surge na sociedade.
Um pai, uma mãe, ou seja quem for, afirmarem que uma mídia, uma novela vai desestruturar famílias parece-me uma falta de compromisso com o seu mister de conduzir, de educar. Onde está a ação desses cuidadores em aproveitamento do que surge na mídia para debates, coletas de opinião com os seus conduzidos, gerando, isto sim, o que muito falta nas famílias: conversas sobre a vida e o que acontece nela?
A sociedade brasileira vive a hipocrisia de zelar por imagens ideais de vitrine. A novela Babilônia retrata em recorte a sociedade, onde em muitos corredores iluminados por led, de enormes apartamentos, filhos cospem, batem em seus pais com pomposos sobrenomes para conseguirem dinheiro para as drogas, raves... mas é escondido. São filhos barbarizando, atropelando, bebendo às quedas, cheios de vícios, mas é por debaixo do pano. Em uma sociedade repleta de hipocrisia, a retórica dos discursos pudicos, em verdade, sempre será o não expor o que se sabe que existe, mas dissimula-se, vivem-se imagens de propaganda de margarina. Não se vê, no entanto, muita gente se indignar quando uma menina de 10, 11 anos, moradora da periferia, é levada a se prostituir no mercado do turismo sexual, ou quando crianças são postas em trabalho escravo. Que importa? Não é o padrão de vitrine da família brasileira, é o submundo dos viventes de uma sociedade que escolhe o que a desagrada, não pela questão em si, mas pelo que é do seu interesse. Babilônia também é Brasil.
José Medrado
Mestre em Família pela UCSal e fundador da Cidade da Luz