A semana passada, vi uma matéria em um desses canais abertos de TV sobre um leão, de nome Ariel, que estava passando por um “grande drama”, pois tinha dificuldade para movimentar as patas traseiras. Pobre bichinho, porém o que me chamou a atenção foi o movimento de solidariedade que esse leão fez em toda a internet; pus o seu nome no pesquisador (leão Ariel) e tinha mais de 1.600.000 páginas, isso mesmo: um milhão e seiscentas mil páginas sobre o leão do Paraná.
As pessoas se voluntariavam para cuidar do leão, centenas de fisioterapeutas, veterinários, gente de toda ordem e lugar. Nada contra se cuidar bem dos animais, mas a própria ONU divulga que a cada três segundos uma criança morre de fome. Vemos, pelo Brasil inteiro, cidades onde os seres humanos vivem em favelas, cujas condições de vida são as mais desumanas possíveis, trabalham nas ruas catando lixo, no local onde moram não existe saneamento básico, nada. As crianças brincam entre montanhas de lixo e animais mortos e não vejo mobilização alguma nesse sistema para melhorar tal situação. A mim pareceu que um leão é muito mais importante do que um ser humano. Esse sistema é tão desigual e mesquinho com a vida real, que as pessoas, penso, perderam a noção do valor das coisas.
O ministro Magri, dos tempos de Collor, fez história ao ser flagrado usando carro oficial para levar sua cadela Orca ao veterinário. Indagado a respeito do mau uso do dinheiro público, Magri disparou com seriedade: “Cachorro também é ser humano”. Reconheçamos, o homem tinha razão, bicho virou gente e, ao que tudo indica, vice-versa.
Parece que o poeta Manuel Bandeira, houvera, em 1947, profetizado tudo isso, quando escreveu O Bicho: “Vi ontem um bicho/ Na imundície do pátio/ Catando comida entre os detritos/. Quando achava alguma coisa,/ Não examinava nem cheirava:/ Engolia com voracidade./ O bicho não era um cão,Não era um gato, / Não era um rato./ O bicho, meu Deus, era um homem”. Tudo normal, pois até os jegues e cavalos estão mais bem defendidos. Ainda vão pedir à polícia montada que invertam as suas posições.